GIRO NA ECONOMIA – Depois da pandemia, é impossível não sentir um certo déjà vu. Os sinais que o Brasil emite hoje lembram, e muito, o cenário de 2014 — aquele período que antecedeu uma das crises econômicas mais profundas da nossa história recente. Estamos novamente diante de déficits gêmeos, juros elevados, pleno emprego artificial e baixa produtividade. Parece que o filme está se repetindo, e com o mesmo roteiro de erros.
A sensação é de que não aprendemos com o passado. Em 2014, os sinais estavam todos lá, mas foram ignorados. Agora, mais uma vez, vemos uma economia travada, com o governo tentando acelerar o carro e o Banco Central puxando o freio de mão para evitar o colapso. O problema é que essa tensão não é gratuita: ela custa caro — para o Estado, para as empresas e para cada cidadão que tenta produzir neste país.
Há quem olhe para a queda do dólar e acredite que o real está mais forte. Não está. O que acontece é que o dólar está enfraquecido globalmente. Ou seja, não é o Brasil que está melhor — é o mundo que está mudando. Por aqui, na verdade, há mais saída do que entrada de dólares. E isso é um péssimo sinal. Os milionários e bilionários brasileiros estão retirando seus recursos, buscando refúgio em lugares com menos incertezas e mais segurança jurídica. Não é uma fuga ideológica, é uma fuga racional. O ambiente de negócios no país está instável, confuso e, acima de tudo, imprevisível.
O que vemos é um cenário em que empreender virou um ato de resistência. As regras mudam o tempo todo — tributárias, regulatórias, fiscais — e a previsibilidade, que é o mínimo que o investidor precisa, simplesmente não existe. E quando a confiança vai embora, o dinheiro vai junto.
Nos últimos anos, a Bolsa de Valores brasileira deixou de ser símbolo de expansão e passou a ser um termômetro da desconfiança. Não temos IPOs — as aberturas de capital praticamente desapareceram — e, o que é pior, as empresas estão saindo da Bolsa. A Gol é apenas um exemplo recente, mas há mais de uma dezena de companhias que desistiram do mercado de capitais nos últimos meses. Isso não é coincidência. É reflexo de um ambiente macroeconômico frágil e contraditório, onde o governo tenta incentivar o crescimento ao mesmo tempo em que o custo de capital — impulsionado pelos juros altos — torna o investimento quase inviável.
O Banco Central tem feito o papel de guardião da estabilidade, mas ao custo de uma economia engessada. Os juros altos seguram a inflação, mas também encarecem o crédito, travam o consumo e aumentam a dívida pública. E essa conta é impagável no longo prazo. O resultado é uma economia que não avança. O governo tenta acelerar, o Banco Central freia, e o país fica parado — queimando combustível e paciência.
Há um dado que me preocupa especialmente: apenas cerca de 25% da população economicamente ativa é responsável por sustentar os outros 75%. Esses 25% são os que realmente produzem, empreendem, pagam impostos e mantêm a máquina girando. O restante está concentrado entre servidores públicos, aposentados, pensionistas e beneficiários de programas sociais. Não é uma crítica moral, é matemática pura. Nenhuma economia se sustenta com uma base produtiva tão pequena. O número ideal seria pelo menos metade da população ativa contribuindo diretamente para o ciclo de riqueza e arrecadação. Estamos longe disso — e cada vez mais distantes.
O que preocupa é que o país vive uma crise de credibilidade. Muda-se regra, muda-se cálculo, muda-se indicador — e o investidor, o empresário, o trabalhador qualificado não sabe mais em que terreno pisa. A política fiscal é errática, a tributária é confusa e a regulatória é inconstante. Vivemos um momento em que o Brasil, que deveria estar colhendo os frutos de uma recuperação global, está espantando o capital produtivo e se isolando das oportunidades.
O alerta está dado. Se o país continuar ignorando a lição de 2014 — acreditando que pode gastar sem reformar, tributar sem simplificar e regular sem previsibilidade —, o final desse déjà vu será o mesmo: crise, recessão e descrédito. Ainda dá tempo de mudar o rumo, mas é preciso, antes de tudo, reconhecer o erro. E esse é sempre o passo mais difícil, na economia e na política.
Vitor Vargas
VV Consulting






