GIRO NO ACERVO MACAENSE – Hoje vamos falar de um tesouro existente em nosso território, mas vamos começar explicando alguns conceitos, para você poder entender melhor, vamos lá?
A geologia é a área do conhecimento que investiga a história profunda do nosso planeta: suas rochas, paisagens, fósseis, transformações e forças naturais que moldaram — e ainda moldam — a Terra que habitamos. Por meio dela, é possível compreender não apenas como surgiram os continentes, os mares e as montanhas, mas também a presença e os vestígios dos seres vivos que caminharam por aqui há milhares, milhões e até bilhões de anos. É nesse contexto que surgem os Geoparques — territórios que reúnem formações geológicas de grande valor científico e paisagens de beleza e relevância internacional, mas que vão além da ciência pura: tratam-se de espaços vivos, onde natureza, história e comunidades se entrelaçam.
Um Geoparque, segundo a UNESCO, é uma área geográfica unificada que promove a proteção do patrimônio natural e cultural, a educação ambiental e o desenvolvimento sustentável. Mas não basta ter paisagens bonitas ou fósseis raros: para conquistar o reconhecimento como Geoparque Global, é necessário envolver a população local, criar ações de preservação e educação, desenvolver o turismo responsável e comprovar sua importância geocientífica. O processo de candidatura é criterioso e inclui desde estudos técnicos até visitas de avaliadores internacionais.
No Brasil, apenas três territórios conquistaram até hoje esse selo da UNESCO: o Geoparque Araripe (CE), o Seridó (RN) e o Caminho dos Cânions do Sul (SC/RS). Porém, um novo e extraordinário território está em fase avançada para se juntar a esse seleto grupo: o Geoparque Costões e Lagunas, que abrange da costa do sol ao litoral norte do estado do Rio de Janeiro, indo de Maricá até São Francisco de Itabapoana. Ao todo, são 16 municípios envolvidos em uma proposta que valoriza não só os costões rochosos, lagunas, restingas e formações fósseis, mas também saberes tradicionais, culturas locais, ecossistemas ricos e a relação histórica das populações com seu território.
À frente dessa mobilização está a geóloga Kátia Mansur, professora emérita da UFRJ e idealizadora do projeto, que desde 2010 articula esforços para tornar esse sonho realidade. Com visão integradora e compromisso com a ciência pública, Kátia reuniu uma equipe multidisciplinar formada por pesquisadores, professores, lideranças populares, artistas e ambientalistas que atuam em rede. O projeto já é reconhecido como Geoparque aspirante
pela UNESCO e, em 2024, recebeu em solo fluminense dois avaliadores internacionais enviados pela própria organização, numa missão oficial que percorreu diversos municípios e confirmou o imenso valor natural e cultural da região. O encontro entre ciência e comunidade, liderado com paixão pela professoara Kátia Mansur, marca um passo decisivo rumo à chancela internacional.
Nesse processo coletivo, o projeto Desvendando Macaé atua com orgulho, desde 2022, como parceiro do Geoparque Costões e Lagunas, desenvolvendo ações de valorização da memória, da história natural e das culturas locais.
O território de Macaé é um verdadeiro santuário da geodiversidade, reunindo uma variedade impressionante de formações e processos geológicos que contam capítulos fundamentais da história do planeta. Aqui, a geologia se manifesta de forma exuberante: dos costões rochosos às serras elevadas, das praias de restinga às lagunas costeiras, tudo revela milhões — e até bilhões — de anos de transformações da crosta terrestre. A cidade abriga rochas do embasamento cristalino com origem no Período Pré-Cambriano, algumas com mais de 600 milhões de anos, visíveis em afloramentos como os do Costão do Farol e da Ilha do Francês, onde as texturas e estruturas revelam antigas colisões de placas tectônicas e processos de metamorfismo profundo.
A Serra da Bicuda, imponente e coberta pela Mata Atlântica, é composta por rochas quartzíticas e apresenta escarpas que funcionam como janelas naturais para a história geológica da região. No litoral, o Arquipélago de Sant’Anna impressiona com suas ilhas de rochas ígneas e metamórficas que resistem bravamente à ação marinha, servindo de referência para estudos sobre erosão costeira e geodinâmica litorânea. O Parque Nacional da Restinga de Jurubatiba, com sua rara sequência de lagunas, cordões arenosos e vegetação de restinga, é um verdadeiro laboratório natural sobre sedimentação, variações do nível do mar e interação entre processos eólicos e marinhos ao longo dos últimos milênios.
A Lagoa de Imboassica também integra esse conjunto, representando uma zona de transição entre ambientes continentais e costeiros, com importância hidrogeológica e ecológica estratégica. Em direção ao interior, destaca-se a monumental Pedra do Frade, estrutura rochosa de grande valor cênico e geológico, símbolo natural do município e exemplo claro de relevo residual esculpido por milhões de anos de intemperismo. A região ainda integra o Sistema Lagunar de Carapebus, onde se observam dunas fósseis, cordões litorâneos abandonados e uma sequência impressionante de formas que revelam antigas linhas de costa atlântica, oferecendo aos estudiosos preciosas evidências sobre as mudanças ambientais ao longo do tempo.
Cada um desses sítios compõe um mosaico geológico de altíssimo valor científico, didático e paisagístico. Mais do que testemunhos do passado, essas formações são ferramentas para a educação, o turismo geocientífico e a construção de uma cultura de pertencimento ao território. Em Macaé, a geologia não está apenas sob nossos pés — ela molda a identidade, a economia, os caminhos e os horizontes. É por isso que o município se destaca como um dos pilares geocientíficos mais relevantes dentro da proposta do Geoparque Costões e Lagunas, reunindo beleza natural, complexidade estrutural e potencial transformador.
Macaé não é apenas um ponto no mapa — é uma chave para compreender toda a complexidade e riqueza do Geoparque Costões e Lagunas. Seu território pulsa com histórias da Terra, da água e das gentes que aqui vivem. Ao integrar-se oficialmente à Rede Global de Geoparques da UNESCO, será também reconhecida como referência internacional de preservação, educação e desenvolvimento local. Que esse tesouro em nosso território seja cada vez mais valorizado, conhecido e protegido — por nós, pelas nossas crianças e por todas as gerações que virão.
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