GIRO ENTREVISTA – Hoje, nosso olhar se volta para Cabo Frio — destino de praias deslumbrantes e rico patrimônio histórico — que lidera a recepção de turistas na Costa do Sol (antiga Região dos Lagos), especialmente na alta temporada. Em 2025, o municÃpio ganhou ainda mais destaque ao iniciar um novo processo de ordenamento turÃstico, com mudanças na organização das praias, infraestrutura da cidade e na forma como recebe seus visitantes.
Para entender melhor essa transformação e os planos para o futuro, o Portal GIRO Costa do Sol conversa com o secretário de Turismo de Cabo Frio, Davi Barcelos. Aos 42 anos, Davi é médico, empresário e diretor do Convention & Visitors Bureau de Cabo Frio, desde 2019. É natural de Quissamã (RJ) e morador de Cabo Frio desde 2014. Em 2018, Davi, iniciou a revitalização da gastronomia local com a abertura do seu restaurante Arcos do Canal – que depois o GIRO vai lá conhecer, no bairro da Passagem.
GIRO COSTA DO SOL – Cabo Frio é um dos destinos mais tradicionais da Costa do Sol (antiga Região dos Lagos) e que mais recebe turistas na alta temporada. Principalmente Réveillon e Carnaval. Em janeiro deste ano, iniciou um processo de ordenamento turÃstico, que estava mais que precisando. Quais foram as principais mudanças até agora e qual é a visão de longo prazo dessa iniciativa?
DAVI BARCELOS – Já no primeiro dia de governo, o prefeito Dr. Serginho publicou um decreto para ordenar as praias e combater o turismo de massa. Tiramos os ambulantes irregulares, dimensionamos a quantidade de mesas para cada barraca, proibimos as caixas de som e estabelecemos barreiras de fiscalização nos locais de acesso à s praias. Proibimos ainda a entrada de ônibus de turismo no centro da cidade, aliviando de forma considerável o tráfego das vias, e aumentamos a taxa ingresso dos mesmos no nosso Terminal de Ônibus de Turismo. Na parte náutica, iniciamos um trabalho de revisão da nossa lei em conjunto com a Marinha e o Ministério Público, uma demanda urgente que temos, em especial pela ocorrência de acidentes no ano de 2024 relacionado ao aluguel de lanchas.
Todas essas ações fazem parte de algo maior, que é o Projeto Orla, uma iniciativa do Governo Federal em parceria com o municÃpio de Cabo Frio que busca ordenar o uso e a ocupação da orla marÃtima, conciliando a necessidade da preservação ambiental com desenvolvimento econômico. Estamos também retomando a nossa rota de transatlânticos, buscando ativar o nosso aeroporto internacional, e recentemente divulgamos o nosso calendário de eventos. Em Tamoios, estamos requalificando a orla do Pontal de Santo Antônio, reabrindo a Capela de Santo Inácio da Fazenda Campos Novos, e promovendo o Parque do Mico-Leão-Dourado. Cabo Frio, muito em breve, será verão o ano inteiro. Seremos exemplo de Economia Azul para todo o paÃs.
GIRO – Como essas mudanças estão sendo recebidas por quem vive do turismo, como comerciantes e guias, e também pelos próprios moradores?
DAVI – A população de modo geral recebe essas mudanças com apoio, reconhecendo a necessidade dessas ações. No trade turÃstico estamos tendo algumas poucas resistências, especialmente dos que dependem de locações de temporada voltadas ao turismo de massa, desqualificado e sem respeitar o meio ambiente, inicialmente resistiram. Mas aos poucos, as pessoas vêm entendendo que problemas antigos precisam ser resolvidos com iniciativas novas e que é necessário buscar um turismo mais qualificado, legal e sustentável. Existe um plano real, com foco coletivo, não pessoal, e espero que o trade turÃstico adote a mesma postura.
GIRO – A cidade também reajustou, recentemente, a taxa de entrada para ônibus e vans de turismo. Quais os motivos por trás dessa decisão e como esses recursos serão aplicados?
DAVI – Essa iniciativa é apenas a primeira de várias outras que ainda serão tomadas. O objetivo é permitir que o turista contribua com recursos que nos ajudarão a melhorar ainda mais o nosso destino. Os valores arrecadados vão para o Fundo Municipal de Turismo, e de lá retornam para a sociedade. A tÃtulo de exemplo, este ano teremos 8 eventos que serão realizados com esses recursos, e dessa forma retroalimentamos o setor. Está em estudo a implantação da Taxa de Proteção Ambiental (TPA). Temos ainda a possibilidade do Room Tax e o Table Tax, que são contribuições dadas pelos turistas aos utilizarem nossos hotéis e restaurantes, respectivamente.
GIRO – Sendo um destino turÃstico tão requisitado, quais são os principais desafios para manter o ordenamento e sustentabilidade?
DAVI – O maior desafio é de educar e conscientizar o turista. Digo sempre que turista qualificado não é aquele que tem dinheiro, mas sim educação. Nossos visitantes precisam entender que a praia é de todos, mas as regras são nossas. Aquele turista que não tiver respeito pelo morador e pelo meio ambiente terá que buscar outro lugar pra ir, pois seremos implacáveis na fiscalização.
GIRO – Há planos para investir mais em infraestrutura, meio ambiente e capacitação da mão de obra local com base nesse novo modelo de gestão?
DAVI – Como destino turÃstico de praia, Cabo Frio reconhece que seu maior patrimônio é o meio ambiente — e essa consciência precisa ser compartilhada por todos. Após anos de abandono, a atual gestão assumiu a responsabilidade de despoluir a Lagoa de Araruama, com foco inicial na Praia do Siqueira. Paralelamente, estão em andamento importantes investimentos em infraestrutura, como a construção de novos hospitais, uma nova licitação para a administração do Aeroporto e a revisão completa do sistema de drenagem pluvial da cidade, historicamente marcado por problemas como buracos e alagamentos.
Além disso, em parceria com o Sebrae, será lançado nos próximos 30 dias aquele que promete ser o maior curso de capacitação de ambulantes do paÃs. A iniciativa oferecerá aos trabalhadores da orla conteúdos sobre gestão financeira, boas práticas ambientais, manuseio, atendimento ao cliente. A capacitação é vista como uma das ferramentas centrais para transformar a relação entre turismo e cidade, promovendo inclusão social, geração de renda e respeito ao meio ambiente. Com isso, teremos um turismo mais organizado, equilibrado e comprometido com o futuro de quem vive e trabalha em Cabo Frio.
GIRO – Recentemente, veio a notÃcia que o aeroporto de Cabo Frio vai passar a receber novos voos comerciais. Como isso se conecta com a estratégia de fortalecimento do turismo da Região Costa do Sol? A expectativa é atrair novos públicos vindos de quais lugares?
DAVI – O nosso Aeroporto Internacional possui a segunda maior pista de pouso e decolagem do Estado do Rio de Janeiro, é um ativo que estava esquecido e sucateado, sendo por muito tempo subutilizado e relegado ao transporte offshore para as plataformas de petróleo. Sua revitalização é fundamental para o fortalecimento do turismo na região, pois, em conjunto com as cidades vizinhas, formamos um destino imbatÃvel, especialmente para os turistas argentinos.
E, acabamos de realizar uma nova licitação para a administração do espaço e estamos com um novo concessionário que está disposto a virar a página. Fui pessoalmente à Argentina em abril desse ano, em parceria com o Cabo Frio Convention Bureau, para realizar um road show e promover o nosso destino junto às operadoras de turismo e às companhias aéreas. Entendemos ainda que uma conexão diária com Guarulhos seja estratégica não só para o turismo, mas também para o mercado corporativo. Estamos tendo bons avanços nas negociações, e a EMBRATUR tem sido uma grande parceira.
GIRO – E para quem está planejando visitar Cabo Frio, o que vem por aÃ? Quais novidades os turistas e moradores podem esperar para as próximas temporadas?
DAVI – Apesar dos nossos grandes avanços, nada é tão rápido quanto gostarÃamos, está sendo uma gestão inicial de enfrentamento, mas que agora já evoluiu para ações estruturantes capazes de gerar legado. Todos podem esperar uma Cabo Frio ainda mais bonita, limpa e segura. Estamos requalificando todos os nossos atrativos históricos e religiosos. Queremos mostrar para o turista que somos muito mais do que praia. Ao morador eu quero dizer que a qualidade de vida de cada um deles e o respeito ao meio ambiente são fatores inegociáveis, e vamos provar que cidade boa para o turista é, antes de tudo, boa para quem mora.
GIRO – E para encerrar: como a população local tem participado do turismo? Existem projetos que envolvem e beneficiam diretamente os moradores? Há programas de capacitação e inclusão para a população?
DAVI – Somos a 5ª cidade mais antiga do Brasil, temos a nossa cultura caiçara e muitas famÃlias de pescadores. Nossas licenças de praia são destinadas única e exclusivamente para moradores da cidade. Como já dito, estamos fornecendo, de forma gratuita e em parceria com o SEBRAE, curso de qualificação para todos os nossos ambulantes. Estamos ainda com um projeto junto à s escolas para a criação de um roteiro de aulas-passeio. Tem crianças do segundo distrito que nunca vieram a cidade de Cabo Frio, e outras do primeiro distrito que nunca viram um Mico-Leão-Dourado. Isso é inadmissÃvel. Não tem segredo. Acredito que a combinação de trabalho duro, respeito ao meio ambiente e educação continuada seja a única solução para tirar a nossa cidade do buraco para a prateleira.