GIRO NO MUNDO DOS VINHOS – Por muito tempo, acreditamos que os vinhos brasileiros só vinham do Rio Grande do Sul — e, de fato, a maior parte ainda vem de lá, especialmente da Serra Gaúcha. Além dela, temos outras regiões importantes no estado, como a Campanha, no extremo sul, as Missões, perto da Argentina, e a Serra do Sudeste, em Encruzilhada do Sul, além de Campos de Cima da Serra, na fronteira com Santa Catarina.
Na Serra Gaúcha estão as vinícolas mais tradicionais e antigas, que vêm se consolidando há anos. Hoje, temos até uma Denominação de Origem (D.O.) no Vale dos Vinhedos, além de duas Indicações de Procedência (I.P.) em Pinto Bandeira, dedicadas exclusivamente aos espumantes, e Altos Montes.
Mas e o resto do Brasil, será que produz bons vinhos? Sim, e muitos deles! Em Santa Catarina, a Serra Catarinense — com cidades como Urupema, São Joaquim e Urubici — vem ganhando destaque com ótimos vinhos. Aliás, há até uma vinícola de um carioca por lá, mas isso fica para um post especial.
No Paraná, a produção tradicional era mais voltada para a uva americana, usada para vinhos mais simples. Porém, essa realidade vem mudando, com o cultivo crescente de uvas viníferas como Cabernet Sauvignon e Merlot. Um destaque é a vinícola Araucária, que vem produzindo vinhos de qualidade.
Subindo para São Paulo, temos a famosa região de São Roque, que também está em processo de transição para uvas viníferas finas. Outras áreas surgem com força, como a Serra da Mantiqueira e a Serra da Bocaina. Já no Sul de Minas, uma região conhecida pelo café, há uma técnica inovadora para produção de uvas, adaptada ao clima local, que tem verão chuvoso e inverno seco.
Essa técnica é a dupla poda (ou poda invertida), que consiste em podar a videira de forma que ela “durma” durante o verão e frutifique no inverno. Essa mudança de ciclo permite cultivar uvas para vinho em locais antes considerados inviáveis para a viticultura.
Essa técnica foi trazida para o Brasil pelo engenheiro agrônomo Murilo Regina, com quem tive o prazer de apresentar um evento numa vinícola do interior de São Paulo. Ele é o principal responsável pela divulgação da dupla poda, que já se espalhou pelo Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste, abrindo caminho para a produção de vinhos em Goiás, Distrito Federal, Bahia, Pernambuco, Espírito Santo, Rio de Janeiro, entre outros.
E quais uvas se destacam nesse tipo de cultivo? Entre as tintas, a Syrah (ou Shiraz) é a grande protagonista, adaptando-se muito bem a diferentes solos e climas. Em seguida, vem a Cabernet Franc. Entre as brancas, a Sauvignon Blanc se destaca por sua acidez e frescor, ganhando mais corpo, notas herbáceas e teor alcoólico nessa técnica. A Viognier, clássica da região do Rhône, também aparece com mais acidez e, em alguns casos, passagem por barricas de carvalho.
Finalizo a coluna deste mês convidando vocês a experimentarem vinhos dessas regiões emergentes do Brasil. Na próxima edição, falarei mais sobre os diferentes tipos de maturação que influenciam a complexidade dos vinhos.
Colunista Rafael Fernandes é head-sommelier da Rede Vino!